13 de ago. de 2007

O Mais Feliz


- O senhor tem plena certeza do que acaba de me falar?
- Dona Cristal saiu foi é bem cedo pro casório, lá em riba da Glória! O sinhô é padrinho? Ei, ô seu moço, pra que a pressa? Virge Maria, o homi esqueceu até o chapéu...
Ariosvaldo não podia acreditar naquela notícia. Não, todas menos Cristal! Logo aquela que tanto amei, com quem planejava filhos, netos e uma casa no campo! Era mentira! O porteiro tinha que estar enganado! Tolo. Pensava em agonia enquanto corria pelas Laranjeiras. Como pude deixar o amor de minha vida escapar assim frágil aos braços de um outro qualquer? Estúpido.
-Para o Outeiro da Glória, o mais rápido possível! - ordenou, ofegante, ao taxista.
Pela janela do carro, a enseada. Pelas memórias de Ariosvaldo, seus passeios de bondinho, os almoços no Amarelinho, as bicicletas-a-dois no Aterro. Como ela doía-lhe em tais lembranças... Ah! A igreja! Cheguei enfim!
- Moço, o senhor esqueceu o troco! Mas que pressa!
Cristal eu te amo, te quero, volte para mim! Escadas, escadas, escadas. Que escadaria mais sem fim! Rompeu a porta a tempo de escutar uma voz ao fundo:
- E agora, eu os declaro marido e...
- Mulher! Quer dizer.. não! Nada disso! Quem deveria estar nesse altar sou eu! Não era bem isso que eu ia dizer... - Ariosvaldo deu-se por conta dos convidados que, estupefados, levantavam-se. Enrubresceu.
- Ariosvaldo, pelo amor de Deus, o que é que está fazendo aqui?
- Celinha? Quer dizer que.. ora vejam só! Onde está sua irmã?
- Celinha, você conhece esse homem? - pergunta seu recém-marido, catatônico.
Desce então, toda em pérola e jasmins, Cristal vem ao seu encontro.
- Meu amor minha deusa minha vida me desculpe eu te amo mais que tudo eu te amo mais que a mim eu te amo volte para mim nao consigo viver sem voce e é impossí...
- Levante-se, Ari. Pode poupar o fôlego - olhava-o como uma criança que esperava para comer o último brigadeiro. E, dirigindo-lhe seu olhar mais doce todo em perdão e confeitado de amor e lágrimas, delicadamente lhe sussurrou: - Vamos para casa, meu bem.


[Cla Cavalin]

(Narrativas de colégio em meras 30 linhas são difíceis pelo pequeno espaço que podemos usar. Nesse tipo de texto, devemos economizar o máximo de linhas possível; deixando muitas características hermeticamente embutidas. Isso se mostra, por exemplo, na escolhas dos nomes das personagens. Ariosvaldo, um homem patriarcal, que tem gosto pelo clássico, pela tradição. Cristal, simbolicamente engloba a pureza, o amor translúcido e fiel. Gosto muito, em tais casos, de usar marcadores de dinamicidade ao texto, como falas diretas, discurso indireto livre, verbos de ação e marcadores de pressuposição. Prezo muito pelas narrativas psicologizantes, considero-as a melhor forma de explorar uma personagem que deseje sair do papel ao imaginário do leitor.)

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